Carta de Princípios da Remus-Rj
quinta-feira, janeiro 16, 2025Rio de Janeiro, janeiro de 2025
CARTA DE PRINCÍPIOS
A Rede de Museologia Social do Rio de Janeiro (Remus-RJ) apresenta a sua Carta de Princípios.
A Remus-Rj, consolidada no ano de 2013, se organizou a partir de algumas iniciativas pioneiras do campo museal, pertencentes a diferentes regiões do estado do Rio de Janeiro, que atuam no resgate, preservação e difusão da memória coletiva e do patrimônio histórico e cultural das populações e culturas periféricas, indígenas e quilombolas, bem como na defesa dos direitos humanos dessas populações, que são nossas ancestrais no enfrentamento aos silenciamentos e apagamentos produzidos pelas classes dominantes aos longo da história de nosso país. Essas iniciativas pioneiras inspiraram e colaboraram com muitas outras no desenvolvimento e reconhecimento das memórias coletivas que não tinham visibilidade na sociedade.
Nascemos, então, da conscientização da relevância das iniciativas e da necessidade de fortalecimento do campo da museologia social, seus atores e sobretudo seus direitos. Em diálogo com o artigo 27 da Declaração Universal de Direitos Humanos e os artigos 13 e 15 do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, defendemos o direito à cultura e a memória como indissociáveis à plena realização dos direitos humanos - universais, indissociáveis e interdependentes - e para a construção positiva da identidade cultural da nossa população, impactando na sua participação na vida cultural.
Entendemos e expressamos a importância da luta coletiva e da organização da sociedade civil como um meio para superarmos as desigualdades e as violências que tanto nos afligem, para construirmos uma sociedade com respeito a diferença e a diversidade, e assim conquistarmos a dignidade da vida humana e da natureza em comunhão.
Neste sentido, promover a conexão e a troca de experiências entre pessoas, coletivos, comunidades populares, movimentos sociais e instituições que atuam no campo da memória, do patrimônio e da cultura fazem parte dos objetivos da Remus-RJ, que surge com o intuito de potencializar a memória como fator de emancipação, coesão e transformação social, integrando as diversas iniciativas e narrativas que compõem a dinâmica museal do estado do Rio de Janeiro.
A Carta de Princípios da Remus-RJ mantém no horizonte a construção participativa de um código orientador de valores que sirva de base para nossas práticas coletivas e individuais, visando a melhoria das relações institucionais e pessoais dentro e fora da Remus-RJ.
São princípios constituintes e orientadores da Remus-RJ:
1. O compromisso e a responsabilidade com a construção de uma Museologia Social que estimule em nós e na sociedade reflexões e práticas solidárias, ecológicas e criativas e, ao mesmo tempo, contrárias a todas as formas de colonização, dominação, opressão e exploração de classe, de raça, de gênero, de idade, de sexualidade, de religião e mais. Além disso, a Remus-RJ está formada nas trincheiras que defendem uma política pública de cultura e de museus em sintonia com a defesa de um novo paradigma sociocultural para lidar com a emergência climática, bem como com os desafios do alastramento da desinformação que atinge de forma nefasta as classes trabalhadoras e os grupos periféricos;
2. A busca sistemática por ações orientadas para a superação das desigualdades sociais e a construção de uma sociedade mais justa, voltada para o diálogo, o respeito e a plena realização da vida humana;
3. O repúdio nos espaços da Remus-RJ das ações e práticas discursivas que ecoem as relações de poder e dominação, bem como os preconceitos e discriminações, reforçados nas bases das sociedades capitalistas que seguem reproduzindo as práticas de racismo, machismo, elitismo, capacitismo, etarismo, aporofobia e LGBTQIAPN+fobia;
4. O repúdio às ações antidemocráticas, autoritárias e individualistas que reproduzem ideias e práticas competitivas, fomentadas por ideologias neoliberais e meritocráticas voltadas para a desagregação da vida comunitária;
5. O reforço ao caráter educacional, pedagógico e formativo da Remus-RJ;
6. O envolvimento com a construção de novas práticas e novas imaginações, visando novas aprendizagens a partir de experiências e relações humanas saudáveis, incluindo as diferentes manifestações de religiosidades indígenas e afro-brasileiras;
7. O diálogo respeitoso com as diferenças, a lida com os conflitos, ideias e práticas divergentes e contraditórias, em sintonia com o encaminhamento de soluções e ações voltadas para o respeito à vida e à construção comunitária, levando sempre em conta os diferentes saberes e fazeres dos povos originários e dos povos afrodescendentes;
8. A busca coletiva por estratégias que fomentem e sustentem o acesso e o compartilhamento de recursos necessários para as iniciativas e comunidades que fazem parte da Remus-RJ;
9. O acolhimento às pessoas, museus e as diversas e diferentes iniciativas que queiram somar com a Remus-RJ e construir seus movimentos de memória, arte, cultura, religiosidade, tendo como referência a Museologia Social;
10. A celebração da vida. Nesse sentido, vale registrar o nosso caráter afetivo, o caráter alegre e festivo dos nossos encontros. Cabe registrar, também, que a alegria, a amizade e o amor às iniciativas, localidades e territórios fazem parte das nossas ferramentas de luta poética e política;
11. O trabalho junto aos órgãos e instituições públicas e governamentais parceiras, visando contribuir com o aperfeiçoamento dos aparatos burocráticos para uma maior inclusão e participação dos grupos e coletivos periféricos no acesso a recursos e meios de sustentabilidade, buscando uma gestão mais democrática nos serviços culturais e nos espaços de decisão, bem como a superação de dificuldades no acesso às informações.
12. O compromisso com a democracia radical. Marcarmos nossa posição enquanto movimento social na luta por direitos para a promoção da justiça social a favor da melhoria das condições materiais de existência dos grupos, localidades e territórios excluídos dos processos de distribuição de riquezas e dos espaços políticos hegemônicos. Neste sentido, repudiamos práticas autoritárias, sem compromissos reais com as classes populares, suas localidades e territórios.
Este pequeno conjunto de princípios deverá servir para orientar as ações e reflexões da Remus-RJ. A adesão à Rede e aos seus princípios é livre.
Que esta Carta de Princípios seja um documento vivo, tal qual os nossos museus e iniciativas. Que esta Carta seja também o resultado de nossos compromissos. Neste sentido, solicitamos que ela seja coletivamente revisitada e recordada, pelo menos uma vez por ano.
Faz parte dos nossos desejos e sonhos poéticos e políticos que a nossa Remus-RJ seja um coletivo de proposições, realizações, inspirações, transformações, apoio e acolhimento; esperamos também que ela seja um espaço onde as pessoas se sintam acolhidas e à vontade para debater e refletir sobre seus conflitos, pautas e ações, levando à formação de laços de solidariedade e amizade.
Afetuosamente,
Rede de Museologia Social do Rio de Janeiro (Remus-RJ)
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